Quinta-feira, 3 de Maio de 2012

Traduzir Sangue Fresco: uma conversa com Renato Carreira

 

Tínhamos prometido que íamos entrevistar o Renato Carreira e, depois de reunirmos as vossas perguntas e as nossas, aqui estão as respostas sobre o que ele acha dos livros do Sangue Fresco, a história que eles contam, a sua opinião sobre a autora  e se é ou não fã da série de tv.


 

Pergunta:  Já conhecias os livros do Sangue Fresco ou o primeiro contacto que tiveste foi quando os recebeste para os traduzir?
Renato Carreira: Conhecia os livros como material de origem da série de televisão. Quando me propuseram traduzir o primeiro, tinha acabado de ver (ou estava a acabar de ver) a primeira temporada. Andava curioso acerca dos livros e foi o melhor pretexto possível para os ler.

Pergunta: Como é que preparas a tradução: fazes uma leitura primeiro do livro e depois traduzes ou inicias imediatamente a tradução?
RC: Nunca leio os livros antes de começar a tradução. Acho que não se ganha nada e até se pode perder. Quando se lê uma coisa com o propósito de traduzir, é inevitável ir traduzindo mentalmente enquanto lemos e, fazendo uma leitura prévia, esse primeiro contacto não seria aproveitado, mesmo com notas extensas. Quase sempre, aquele primeiro instinto de conversão de palavras e frases é o mais indicado.

Pergunta: Quanto tempo demoras a traduzir um livro da Saga Sangue Fresco, em média?
RC: Mais ou menos um mês e meio.

Pergunta: Qual a parte mais difícil de traduzir Sangue Fresco?
RC: Não há um pormenor que possa apontar como sendo mais difícil. A autora escreve num estilo bastante corrente e sabe o que faz. Os livros escritos por quem sabe escrever nunca são difíceis de traduzir. Podem apresentar desafios, mas isso só enriquece o processo. Difíceis de traduzir são os livros maus.

Pergunta: Tenho curiosidade relativamente à tradução de "fangbanger". É uma palavra exclusiva da saga portanto o que te levou a traduzi-la para vampirófilo? [Na tradução da série para a RTP optaram por papa-vampiros] Deu-te muitas dores de cabeça achar uma tradução que não parecesse ridícula?
RC: Nos livros, os "fangbangers" são apresentados como uma tara sexual malvista pela sociedade. Em português, a maior parte das taras têm nomes compostos com "filia" no fim (pedofilia, zoofilia, necrofilia etc.) e achei que seria adequado, não sendo possível uma tradução direta do termo original. "Papa-vampiros" faz-me pensar em alguém que aprecia vampiros de uma forma mais gastronómica e devem ser um bocado secos de mastigar.

Pergunta: Ainda sobre o vocabulário específico desta saga: A Charlainne Harris é e escreve sobre uma região muito específica dos EUA, nomeadamente o Louisiana, região que tem expressões, dizeres e uma gastronomia muito peculiares. A juntar a esse facto ainda há o vocabulário relacionado com o sobrenatural: vampiros, fadas, lobisomens, metamorfos... Manténs uma espécie de “glossário” de Sangue Fresco, que consultas sempre que é necessário?
RC: Não mantenho e sinto muitas vezes que devia manter. Facilitava-me muito a vida. Quando preciso de recordar um termo recorrente, tenho de ir procurar nos livros anteriores.
 
Pergunta: No processo de tradução consegues te manter emocionalmente afastado da história? É algo completamente profissional ou há momentos em que te vês envolvido com as personagens e emocionas-te com momentos mais tristes ou feliz quando uma personagem está feliz?
RC: Até hoje, não chorei enquanto traduzo um livro, mas já me ri muitas vezes. Durante a tradução, estou também a ler e o envolvimento emocional é o mesmo que sente qualquer leitor. Também há livros que "prendem" o tradutor.

Pergunta: Tu és uma pessoa muito bem humorada, basta ler o Inépcia para perceber isso, e a escrita da Charlaine Harris também o é, com momentos bem cómicos. Quanto desse bom-humor é teu e quanto é o da autora? Ou ambos se fundem para darem origem ao produto que conhecemos?
RC: O humor é dela quase sempre. Só quando há piadas ou trocadilhos impossíveis de transpor para o português é que tenho de tentar arranjar substitutos à altura. Traduzir é rescrever um texto noutra língua, mas é preciso fazê-lo de forma tão fiel ao original que ninguém dê pelo trabalho do tradutor. É um bocado inglório, mas ainda bem que é assim.

Pergunta: Dos livros traduzidos até ao momento, tens algum livro favorito? E personagem?

RC: O primeiro tem sempre aquele encanto especial, mas acho que escolheria o "Clube de Sangue" como preferido. Quanto a personagem, (descontando o Eric que deve ser a personagem preferida de toda a gente) gosto do sarcasmo da Pam e da personalidade assumidamente intragável do Claude.

Pergunta: A saga está a chegar ao fim, o 12º volume está disponível nos EUA desde o dia 1 de Maio e o 13º e último volume será lançado em Maio do próximo ano. Qual destas palavras melhor caracteriza o teu estado de espírito perante esse facto: alívio, saudade, dever cumprido? Estás, como os fãs, curioso por saber o destino da Sookie?
RC: Saudade sim. Dever cumprido espero que também. Alívio não. Tem sido um prazer. E claro que estou curioso, mas não consigo perceber como acabará (o que é muito positivo). Pelo andar da carruagem, parece-me que o destino romântico da Sookie será uma espécie de poligamia sobrenatural muito movimentada.

Pergunta: Acompanhas a série de TV "True Blood"? Se sim, qual a tua opinião sobre ela? Livros vs Série, qual é a tua "versão" favorita?
RC: Acompanho desde o início. Gostei do trabalho do Alan Ball na série "Sete Palmos de Terra" e foi por ele que comecei a ver. É um estilo completamente diferente, mas acho que funciona muito bem. Não consigo escolher entre os livros e a série. Apesar de a adaptação ser muito fiel, conseguiu fazer-se uma coisa com existência independente e com méritos próprios. Por exemplo, sem a série, não teríamos o desenvolvimento de personagens como a Tara e o Lafayette.

Pergunta: Tu também és autor na área do fantástico. Sentes que, ao teres traduzido estes livros e, teres passado tanto tempo com este material, que ganhaste algo com eles? Por outras palavras, sentes que esta autora te ensinou algo? Se sim, o quê?
RC: Quem escreve, é sempre influenciado e enriquecido pelas coisas que lê. Como o tradutor também é leitor e porque a Charlaine Harris é uma autora talentosa e que conheço tão bem, de certeza que aprendi muitas coisas com ela, mesmo que de forma subconsciente.

Pergunta: Falando um pouco sobre a tua obra publicada, o “O Fim Chega Numa Manhã de Nevoeiro” também publicado pela Saída de Emergência, é um policial que acontece em Lisboa, e com traços de fantasia ou sobrenatural. (Disse bem, é isto?) Acima de tudo parece ser um livro divertido. Fala-nos um pouco sobre ele.
RC: Tenta ser divertido e espero que consiga. Não sendo humor como o livro anterior, a minha intenção era fazer uma história com laivos de "pulp" e de filme de série B que integrasse o sobrenatural na realidade portuguesa e, mais especificamente, na cidade de Lisboa. Tem feiticeiros envolvidos numa conspiração, criaturas sobrenaturais variadas, tiros, efeitos especiais, extraterrestres, sexo tórrido, dinossauros, sexo tórrido COM dinossauros... É mentira que tenha isto tudo. Desculpem. Deixei-me levar pela descrição e espalhei-me ao comprido.

 


Obrigada Renato pelas simpáticas e divertidas respostas. Acho que tão depressa não vamos esquecer que "os vampiros devem ser um bocado secos de mastigar" ou de como deve ser "sexo com dinossauros".

Também um grande obrigada ao Rui Pedro e ao Pedro André que contribuiram com as suas perguntas para esta entrevista.

 

Podem descobrir mais sobre o Renato Carreira nos seguintes links:

Renato Carreira
Capítulo Zero
Página de autor no Goodreads
Inépcia
E podem encontrar os seus livros no site da Saída de Emergência: História de Portugal Director´s Cut e O Fim Chega Numa Manhã de Nevoeiro

 


publicado por sangue-fresco às 22:39
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